John T. Landry, editor para desenvolvimento de negócios da Harvard Business Review, acredita que as revistas devem ser focadas naquilo que o leitor precisa.
O mercado editorial moderno está aberto para novas ou antigas idéias. O crescimento das revistas de conhecimento, publicações dirigidas a um público qualificado, com textos mais profundos, artigos longos e que procura incentivar o pensamento, a análise dos fatos e não noticiá-los, como as semanais, é um fato que comprova essa tese. A revista Superinteressante, publicada pela Editora Abril, já é hoje a segunda maior publicação mensal do País, segundo dados divulgados pela Aner (Associação Nacional de Editores de Revistas).
Dentro desse universo de idéias, a Harvard Business Review é um dos melhores exemplos desse conteúdo diferenciado. Com 80 anos, já passaram pelas páginas da revista nomes importantes da administração e negócios como Peter Drucker, Michael Porter, John Kotter, entre outros. Seu conteúdo não é dos mais fáceis, com textos longos, complexos e, principalmente, ideais. O objetivo é inspirar empresários a traçar novos caminhos para as empresas onde trabalham.
John T. Landry é o Editor de Desenvolvimento de Negócios da publicação. Nascido em Washington D.C (capital dos Estados Unidos) em 1964, ele é graduado em Ciência Humanas pela Universidade de Chicago e tem Ph.D em História pela Universidade Brown. Trabalha desde 1996 na equipe da Harvard Business Review, primeiro como editor e desde 2001 ocupa o atual cargo. "Minha função é representar a equipe editorial da revista em qualquer reunião ou evento de negócios. Muita gente com quem trabalho também não entende direito essa descrição, mas é isso que faço", explica Landry. Ele esteve no Brasil para participar de workshops com a equipe que produz a versão brasileira da revista e concedeu essa entrevista exclusiva ao Portal da da Comunicação.
No Brasil a Harvard Busines Review é orgulhosamente impressa pela VOX.
O que diferencia a sua publicação das outras?
Jornalismo é sobre eventos, sobre assuntos que interferem na vida cotidiana. Em muitas revistas de negócios, como Forbes, Fortune, e outras, o que temos é jornalismo. A Harvard Business Review é sobre idéias, artigos que vão ajudar o executivo a gerenciar melhor a empresa onde ele trabalha. Ela os ajuda a pensar sobre os desafios que terão que enfrentar para fazer um bom trabalho. Oferecemos artigos que trazem uma maneira diferente de pensar o negócio. Não estamos aqui para dizer a eles o que fazer, não é um guia de instruções, mas damos direções de pensamentos que podem fazer a diferença.
Como convencer o anunciante a comprar essa idéia?
Nosso principal desafio é que somos caros. Nosso custo por mil é muito maior do que qualquer outra revista de negócios tradicional. Nem chegam perto. O custo de anunciar conosco é igual ao de anunciar numa Forbes, por exemplo, mas eles têm o triplo de circulação. Os anunciantes interessados, quando vêem nossas tabelas de circulação e de preço, desistem. Dizem que somos caros. O que fazemos é dizer que oferecemos a eles um leitor melhor, que é um gerente de nível bem elevado, com altos salários, que atingimos quem realmente decide. Nosso discurso é algo como, se você quer atingir o executivo que toma as decisões de compra, precisa anunciar conosco. Se anunciar na Forbes, você atinge um nível de gerência mediana, que não pode tomar decisões. No nosso caso, nossos artigos são mais densos, longos, nossos leitores guardam as revistas para consultas futuras. Isso ajuda na hora de vender anúncios, apesar de nossa revista não ter muitos anunciantes.
A Internet revolucionou o modo como as pessoas buscam informação hoje em dia. Como você encara a Internet?
A rede mundial de computadores é, ao mesmo tempo, uma mídia repleta de oportunidades e uma ameaça ao que fazemos, que é revista impressa. Alguns autores que têm boas idéias podem não vir diretamente para nós para publicarem seus artigos. Tivemos um caso assim recentemente. Jim Collins, que escreveu um texto para nós há dois anos, teve uma nova idéia e, em vez de publicar o texto em nossa revista, ele produziu uma brochura e passou a vender o artigo diretamente pela Amazon.com. Dessa maneira, o autor será melhor remunerado pelo trabalho, pois publicando na revista ele não receberia, com certeza, o mesmo valor pelo trabalho. Foi a primeira vez que isso aconteceu, mas é um exemplo claro de como a Internet pode ser uma ameaça. Acreditamos que a revista impressa tem um valor agregado muito maior do que um texto da Internet. A rede tem muita informação e não é possível ter certeza da veracidade das informações ali publicadas. O que oferecemos é organização. Entregamos artigos que são realmente importantes para o trabalho dos executivos. Também fazemos um trabalho de desenvolvimento das idéias. Pegamos o material bruto e desenvolvemos para que ele seja completamente aproveitado pelos nossos leitores. Elas se tornam reais, vivas.
E como a Internet pode ser bem aproveitada?
A web é uma ferramenta de vendas poderosa. Quem não quiser ser um assinante da nossa revista pode ir até o site e comprar uma republicação de um determinado artigo. Nós vendemos bastante reimpressões de artigos e a internet é uma maneira eficiente de distribuir esse material, de vender esse material, melhor dizendo. A maioria das pessoas que precisa comprar um determinado artigo vai diretamente ao nosso site e faz a compra, baixa o arquivo e o imprime em casa. Além disso, vendemos assinaturas pela Internet, que é muito rápido e prático. Mas não queremos ficar apenas vendendo na Internet. Temos um projeto para criar conteúdo diferenciado para a web, exclusivo. Não vamos ter apenas a republicação da versão impressa, como é hoje. Estamos trabalhando para ter artigos exclusivos para a Internet, com bastante interatividade.
Como seria essa interação entre leitor e revista, já que vocês são bastante especializados?
Ainda não temos algo definido. Já tentamos algo interessante, mas que provou ser um grande fracasso. Alguns dos nossos leitores são grandes executivos que não têm tempo para escrever. Tentamos encorajar essas pessoas a escrever comentários, enviar um feedback. Era um formulário eletrônico e ninguém participava. Quando alguém escrevia, era sobre qualquer assunto, não apenas o foco do artigo. Foi um erro. Nas revistas de atualidade, como as de política, as pessoas escrevem e participam. Nosso leitor não é assim. Por enquanto teremos artigos especiais para a Internet, uma ferramenta de busca, é nisso que estamos trabalhando. Somos conservadores. Nosso site não é nenhuma maravilha, por isso queremos melhorar esse aspecto.
E o futuro das revistas impressas?
É uma boa pergunta. Tem dois pontos importantes. Não sou um especialista neste assunto, já que a revista onde trabalho é incomum, mas pela minha experiência, o principal desafio das revistas é a publicidade. Existem muitas dúvidas sobre a eficiência da propaganda. Posso afirmar, pela nossa experiência, está cada vez mais difícil vender anúncios em revistas. Principalmente fazer um contrato de longa duração. Antigamente, era possível fechar um contrato para um ano, ou doze edições. Era ótimo, porque podíamos prever as páginas comerciais com antecedência. Agora, as agências compram três meses ou pior, uma página por mês, caso a caso. É algo muito mais volátil do que era anos atrás. Isso reflete uma fuga dos anunciantes das revistas. Sem falar nas muitas oportunidades que existem hoje, como a Internet. O marketing mudou muito. A publicidade tradicional, com anúncios impressos, está sendo reavaliada. Elas vão cair, e na verdade, já caíram. Grandes empresas, como a Time-Warner, tiveram que demitir funcionários. Problemas com anúncios, com certeza.
Você acredita que isso irá acontecer com sua revista?
Bem, acho que estamos melhor protegidos do que a maioria das publicações, porque os anúncios que temos estão mais ligados a imagem, mais relacionados com imagem corporativo, com marcas, do que a venda de produtos. Isso geralmente é associado com um certo tipo de revista que não está tão preocupada com circulação, mas está relacionada a uma imagem. Acho que estamos, de certa maneira, um pouco mais longe desse problema.
Qual o outro ponto importante?
Bom, acredito que o outro dilema seria as pessoas pararem de imprimir revistas para que elas sejam lidas apenas on-line. Aqui existe um grande desafio. Eu não entendo muito desse negócio de blogs, mas eles estão cada vez mais populares e se tornando um competidor para as revistas e jornais. Não sei como eles são lidos por aqui no Brasil, mas, para mim, é uma grande surpresa o sucesso dos blogs. As pessoas querem uma leitura mais rápida e um conteúdo mais opinativo. O trabalho de edição já não é mais tão importante como costumava ser. Acho que por isso os leitores têm procurado a Internet para se informar. Essa é a ameaça real para as revistas impressas. Nossa vantagem é que os artigos que publicamos são longos, complexos, com mais de 5 mil palavras, você não vai ler algo tão extenso assim na Internet, vai querer uma versão impressa. Acho que estaremos protegidos por algum tempo, mas mesmo assim, isso vai nos afetar.
Essa não é uma visão muito pessimista para o setor de revistas?
Eu não gosto de pensar que o futuro será negro, mas acho que ele trará novas oportunidades e ameaças para todos os negócios, em todos os tempos. Teremos que nos adaptar. A tecnologia é boa, em princípio, e teremos que nos adaptar para entregar ao nosso leitor o que ele precisa quando ele necessita. Hoje em dia é muito mais fácil, por causa da tecnologia, fazer uma revista, um livro e colocar suas idéias à venda. Veja bem, acredito que nosso modelo editorial sempre será necessário. Isso é um fato. Recebemos diversos artigos e temos certeza que se esses autores fossem vender seus textos diretamente a executivos, seria uma perda de tempo, não seriam lidos. Temos uma vantagem, que é estamos a serviço de leitores que têm muito dinheiro e muito pouco tempo. Eles querem edição, são os maiores consumidores de produtos editados, mais do que qualquer outro leitor. Isso porque eles podem pagar esse processo e querem que nossa edição poupe o tempo deles. Isso porque querem ler apenas material de excelente qualidade e da maneira mais eficiente possível. Eles são o suporte para a nossa equipe, que edita os artigos publicados. Confiamos muito em nosso modelo editorial, que oferece um valor real para os executivos que lêem nossa revista.
Os blogs, hoje em dia, estão afetando as empresas. Como o executivo interage com a publicação de um blog negativo?
Publicamos um artigo sobre este tema alguns meses atrás. Era sobre como os empresários precisam escrever seus próprios blogs. A mensagem é simples: contra-ataque usando blogs. Assim, será possível responder, principalmente as críticas, e as más notícias poderão ser balanceadas. Mas isso também quer dizer que há uma nova responsabilidade para eles, que é ler e monitorar blogs, isso é uma grande desafio, mas as grandes empresas podem realizar essa tarefa. As empresas precisam encarar isso como uma publicidade. Nos Estados Unidos, as revistas são vendidas praticamente apenas por assinaturas. Sim, nós trabalhamos basicamente assinaturas, o que é um pouco diferente do modelo aqui no Brasil.
Sim, e o sistema de distribuição é feito quase todo pelo correio. Não é temeroso manter um processo tão importante não mão de apenas uma empresa?
Não, isso não é um problema. Nosso correio é extremamente confiável. Temos problemas em países como a Índia e China, onde os correios não são tão eficientes. Nesses casos, usamos um serviço particular. Mas preferimos utilizar os correios sempre que possível.
Qual o maior desafio das edições internacionais da Harvard Business Review? Tradução ou a edição dos artigos?
Eu diria que é a produção de conteúdo local. As edições internacionais publicam vários artigos traduzidos, mas queremos ter sempre textos produzidos no país. A maioria tem apenas material complementar ao texto original, uma coluna lateral, comentários específicos, em outros casos, pequenos artigos, no geral. Mas conseguimos publicar alguns textos originais, e isso é a parte mais difícil do trabalho. A curva de aprendizado é muito alta, porque a maioria dos editores estrangeiros são jornalistas e tendem a pensar como tal. É preciso mudar o jeito de como eles pensam para produzirem artigos baseados em idéias, em vez de textos factuais. Na edição para América Latina, por exemplo, aconteceu um pouco disso, ficava-se focado na notícia e não nas idéias, em como ajudar os executivos a trabalharem melhor. É um aprendizado constante.
As revistas são o melhor veículo para as idéias do que a Internet, por exemplo?
Bom, minha opinião pessoal é que as revistas vão ser dirigidas a nichos. O problema de publicações mais gerais, como a Time, por exemplo, ou as revistas de moda ou de negócios, é que elas querem agradar a uma gama muito diferente de públicos e o resultado acaba não sendo satisfatório. Não conseguem trazer detalhes sobre os temas. Se estamos procurando idéias específicas, informações focadas, o melhor local é a Internet. As revistas, por outro lado, são o meio termo entre a Internet e os livros. São mais freqüentes que os livros, mas não tanto como a internet, são melhor editadas que a web, trazem mais variedades que os livros, mas não como a Internet. Mas elas precisam melhorar o foco. Isso é muito fácil para eu dizer, pois trabalho numa revista que tem um foco específico, mas posso dizer pela minha experiência que procuro ler aquelas publicações que trazem informações relevantes para mim. São assuntos que, muito provavelmente, não são importantes para muita gente, mas são para mim. Talvez isso aconteça porque estou mais velho, não tenho mais interesse em muita coisa. Talvez isso explique porque os blogs fazem tanto sucesso, porque eles tem um conteúdo que é importante um determinado público leitor, se identificam com o autor.
Sim, é bem possível. Existem blogs sobre temas muito, muito específicos. Ele pode ter apenas 10 leitores no mundo todo, mas tudo bem. Há um público interessado nessa idéia. A Internet é uma maravilha por isso.
Que tipos de revistas você lê?
Basicamente sobre meus interesses pessoais. Minha esposa e eu somos religiosos, por isso leio revistas religiosas, revistas sobre nossa faculdade. De vez em quando lemos artigos sobre política, opinativos, mas não temos muito tempo porque temos dois filhos. Prefiro revistas mais intelectuais.
Fonte: Portal da Comunicação
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